quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

MOFO






As circunstâncias diziam-me a verdade
quando da tarde o fim oculto
ditava parâmetros pluvializados.
Mofo e tempo carcomiam
a geometria esquecida das coisas,
inimpedível destino
da materialização das ideias.

A concretude carcome o que materializa,
interpreta as intangibilidades
e as deforma em sua própria decomposição e arruínio
enquanto nos esforçamos
para quadrilateralizar os azulejos
das caixas em que moramos.

De distúrbio em distúrbio,
depositamos na organização
uma fé inabalável,
fazendo da Verdade um atributo
do que experienciamos haver.

O início da chuva anunciada outrora
é sentido minutos depois
do início dela.
Definir quando a chuva ou o sonho começam
é tarefa digna de semideuses
(e definir a definição é o hobby do demônio).

A trajetória irrepetível de cada gota
é o que torna a queda
uma lei.

Ainda que tudo seja forma,
a forma é pura desimportância.
O aspecto vil do mofo
é justamente o de se incomodar
em destruí-la.

As circunstâncias dizem-me a verdade:
sou puro mofo a ler a Folha de São Paulo
e não há nada de heroico nisso,
como querem os educadores.

Enquanto a chuva não cai
(porque é a própria queda coletiva
das gotas quando nascem),
preparo o ambiente do mofo
do qual só a arte
e uma única outra coisa
podem libertar-me.

A mim
e à minha formal
desimportância.

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