quinta-feira, 11 de agosto de 2016

DA VANGUARDA AO NADA (libelo contra o óbvio aberto)

Quando o mictório exposto for imitado pelo silêncio ilimitado imitado numa peça musical,
dir-se-á: "ó, nova musa que és anti ante regras estabelecidas: que regra segue-se de teu semblante?".
Ela sorrirá de soslaio, enigmaticamente, em uma deixa para que dançarinos nus
estejam nus porque têm pau e não porque têm contexto.
O poeta rugirá somente consoantes e o medo de ser idiota aplaudirá.

É necessário destruir a arte burguesa. Somente antiarte burguesa poderá fazê-lo.

Deve-se vender livros sobre como desconstruir os livros
e fazer palestas sobre como escrevê-los, em Nova York,
entre etéreas redundâncias de frases eletrônicas e projeções de manchas transmutantes de cor,
belas como não poderiam deixar de ser quando ainda são ao menos luz.

A regra da nova musa impõe que eliminemos toda a metafísica,
mas que sejamos metafísicos na explicação do motivo pelo qual algum ator infeliz
conversa com a coxia como se entre as coxas do espanto da plateia,
que descobre instante a instante que exatamente todas as suas percepções sobre a vida
são erradas.

Não há acerto onde não há pergunta, nem pergunta onde pontos de vista são o novo Deus.

"A arte é um cadáver", diz a nova musa prazerosamente para seus executores de qualquer coisa.
"Por que perscrutais frases na segunda pessoa do plural,
que só há nas bíblias e em textos com mais de trezentos caracteres?
Não há mais discursos de tal monta, eliminai segundas pessoas do que escreveis!".

Por uma sanha dialética, deve-se ser diferente de todos para pregar a igualdade entre as pessoas,
pois estas só enxergam a diferença. Necessariamente.
Caso haja algum crítico que enxergue nexos de igualdade
entre tua coisa qualquer que fizeste e a do outro,
deve-se repetir a frase: "você não entendeu o que eu quis dizer".
Convém também dizer, após uma eventual segunda investida do crítico: "é uma questão de gosto"
e encerrar a conversa para discutir questões financeiras com o agente ou o político mais próximo.
Jamais discutir o gosto e tratá-lo como religião é exaltar a nova musa,
ela que está para as vanguardas como o evangelho de João está para a Torá.

"O meio é a mensagem", sussurra a televisão desligada, irônica.
Há muito temos levado telas a sério. Como inimigas, inclusive...

A nova musa sorri ainda de soslaio,
porque entende a televisão como ninguém...
sabe que não durará...
enquanto isso um filme mais ou menos igual à vida
passa diante dos seus olhos e a nova musa finge que não vê.
Ela não tem interesse em destruir ou desconstruir o que não é arte.

O mictório exposto no museu é inimitável.
O mictório exposto de novo no museu é nada.
Dá pra medir em bits.